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A saúde de uma população está diretamente relacionada ao ambiente físico que ela habita, assim como disse Hipócrates em seu texto “Ares, águas e lugares”, escrito durante o século V a.C.

Nele, o pensador grego conhecido como o ‘pai da medicina’, afirma que para se investigar corretamente a saúde e a causa das doenças é necessário observar e compreender o ambiente habitado a partir das estações do ano, dos ventos, das águas, da sua posição geográfica, da terra e da paisagem e também dos hábitos das pessoas que ali habitam.

Cada civilização desenvolveu uma forma de lidar com o que hoje entendemos por saneamento, a depender de seu tempo e também de seu contexto geográfico, cultural, político e econômico.

Latrinas medievais. Image Cortesia de Geopizza, usada sob os termos de “fair use”

As primeiras civilizações hidráulicas com redes de agua e esgoto

As primeiras civilizações que se têm registro são conhecidas como civilizações hidráulicas, como o Egito e a Mesopotâmia. Elas, assim como a China e o Vale do Indo, foram desenvolv junto de bacias hidrográficas e próximas a grandes rios.

Essa proximidade e o conhecimento sobre como manipular os recursos da terra, principalmente a água dos rios, foi fundamental para seu crescimento.

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No Egito, por exemplo, o controle da periodicidade do Rio Nilo permitia um sistema de irrigação e a construção de diques e água encanada que abastecia o palácio. Já na Antiga Babilônia há registro de redes de água e esgoto desde cerca de 3.000 a.c.

Tempos depois, a Civilização Romana desenvolveu sistemas de esgoto e de abastecimento que possibilitaram o crescimento de seu império. A Cloaca Máxima e os Aquedutos, acompanhados do conjunto de latrinas e termas públicas, foram essenciais para a cultura romana.

Típico aqueduto romano. Image © Izabela Miszczak Via Flickr

O Banho: Uma sofisticação significativa para a higiene e saúde

A prática dos banhos públicos eram comuns em muitas civilizações, como os gregos, persas, egípcios, bizantinos, árabes e turcos, porém foram os romanos que popularizaram seu uso. Para eles, tanto os banhos quanto as latrinas eram lugares de socialização.

Resquícios de Latrinas Romanas

O banheiro era comunitário e não necessariamente havia diferenciação de gênero. Todos se sentavam lado a lado em uma latrina coletiva.

Ali as pessoas faziam suas necessidades enquanto interagiam, debatiam assuntos diversos e, até mesmo, realizavam banquetes. Os dejetos da latrina eram coletados e levados para a Cloaca Máxima. Paralelamente a este sistema, os grandes aquedutos coletavam a água dos rios e as transportavam para os centros urbanos, abastecendo as cidades de água limpa.

Resquícios de Latrinas Romanas na Tunísia. Image © archer10 Dennis on Visualhunt

Uma responsabilidade coletiva dos governantes

Durante o império romano havia o entendimento de que o saneamento era uma responsabilidade coletiva e portanto essas grandes obras eram pautadas pelos governantes. A partir da queda do império romano e da ascensão do moralismo cristão e do sistema feudal, esta concepção mudou e as condições sanitárias regrediram.

Os banhos e latrinas públicas foram proibidos por serem considerados imorais, o que afetou a relação das pessoas com a higiene, que passou de uma necessidade básica e coletiva para uma prática individual quase pecaminosa.

Assim, sem a infraestrutura coletiva, a higiene foi adaptada às condições da época. Durante a idade média e parte da idade moderna, não houve construção de redes de esgoto ou abastecimento enquanto as práticas de higiene foram individualizadas e adaptadas.

Ilustração Latrinas Medievais. Image Cortesia de Geopizza, usada sob os termos de “fair use”

O inicio dos banhos privados: a fragmentação dos sistemas sanitários

É a partir daí que os banheiros conforme conhecemos hoje começam a aparecer. Nas casas mais nobres criaram-se salas de uso específico, que continham, primeiramente, apenas uma latrina, enquanto a população mais pobre, em geral, fazia suas necessidades em penicos.

Não havia nenhum tipo de rede de esgoto ou de abastecimento de água e os dejetos eram jogados nos rios próximos, em terrenos vazios ou na própria rua, tornando a situação propícia para a disseminação de muitas doenças. Essa situação perdurou durante séculos, com invenções pontuais servindo como auxílio para a higienização pessoal e dando forma aos equipamentos que usamos hoje.

Torre com saídas para os dejetos das latrinas. Image Cortesia de Geopizza, usada sob os termos de “fair use”

A latrina, por exemplo, foi sendo aperfeiçoada até o século XVIII quando o vaso sanitário com descarga surge na Inglaterra, enquanto o bidê, que foi também uma adaptação da latrina, surge na França no mesmo século, para a higienização das partes íntimas.

O chuveiro, por outro lado, tem registros desde a civilização Egípcia, mas sua invenção como conhecemos hoje é datada também do século XVIII.

Com o passar das décadas, a tecnologia foi evoluindo e junto dela a cultura de higiene pessoal também foi sendo reconstruída e ressignificada. Os banheiros em sua configuração atual levaram cerca de cinco séculos para se popularizarem, tornando-se usuais e acessíveis apenas no século XX.

Banheiro na era moderna. Cortesia de Geopizza, usada sob os termos de “fair use”

Esse desenvolvimento não seria possível se não houvesse também o desenvolvimento de redes e sistemas de esgoto e abastecimento comuns nas cidades. O primeiro sistema de saneamento básico reconhecido da atualidade foi instalado em Londres na segunda metade do século XIX, após a epidemia de cólera.

Banho moderno: medida de saúde publica obrigatória e desigualdade social

Ao mesmo tempo, o desenvolvimento dos equipamentos dessas salas de banho também foi avançando de acordo com a evolução das redes. Os equipamentos sanitários que usamos hoje são possibilitados principalmente pelo sistema de esgoto e abastecimento coletivo e também pela água encanada.

Apartamento Mumbai Nelly Prodan Design. Image © Yevhenii Avramenko

Desde então, a tecnologia continua evoluindo e trazendo inovações, mas uma questão que permanece é o banheiro como artigo de luxo. Por um lado, as louças e acabamentos ganharam materiais nobres e alta tecnologia para transformar sua experiência em algo luxuoso.

Por outro, há ainda uma grande parte da população mundial que não tem acesso a banheiros e saneamento básico regularmente, situação que se agravou após a pandemia de Covid-19. Isso é reflexo do desenvolvimento desigual ao redor do mundo, que acaba marginalizando populações inteiras.

Assim como na antiguidade, é preciso pensar no saneamento como media de saúde pública coletiva e como forma de combater as desigualdades da sociedade.

Política de Uso 

A reprodução de matérias é livre mediante a citação do título do texto com link apontando para este texto. Crédito do site Nature & Space 

SANEAMENTO E SAÚDE AMBIENTAL: A EVOLUÇÃO DOS BANHEIROS NA HISTÓRIA

Fontes

CAIRUS, Henrique F. Ares, águas e lugares. In: CAIRUS, HF., and RIBEIRO JR., WA. Textos hipocráticos: o doente, o médico e a doença, 2005.

VILAR, Leando. Uma história sobre o banheiro, 2020.
​ArchDaily

Giovana Martino. “De um mal necessário ao luxo: a história dos banheiros na sociedade moderna ” 01 Fev 2022. ArchDaily Brasil. Acessado 9 Ago 2024. <https://www.archdaily.com.br/br/975151/de-um-mal-necessario-ao-luxo-a-historia-dos-banheiros-na-sociedade-moderna> ISSN 0719-8906

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