Atualizado 4 de junho de 2025 por Sergio A. Loiola
Arqueólogos resgataram os fósseis e a receita de um pão de 14,4 mil anos, no nordeste da Jordânia. Era um pão multi grãos, com cevada, einkorn e aveia selvagens e raízes moídos.
Existem evidências de pães e fornos para assar há mais de 20 mil anos, contudo, com este pão fóssil foi possível refazer a receita e assar novamente um pão similar.
A pesquisa foi publicada nas revistas PNAS e Nature.

“Esta é a primeira evidência que temos do que poderíamos chamar de cozinha, com um produto misto de alimentos”, diz o professor Dorian Fuller, da UCL (University College London)
Quem nasceu antes, o pão ou a agricultura?
Diferente do que se imaginava, cientistas descobrem que pão é pelo menos 4 mil anos mais antigo que agricultura
Isso levanta a intrigante possibilidade de que o cultivo de cereais para pão possa ter sido a força-motriz por trás da agricultura.
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Arqueobotânica revela receita de pão há 14.400 anos no nordeste da Jordânia
Apesar de ser um dos alimentos mais importantes consumidos no mundo moderno, as origens do pão ainda são em grande parte desconhecidas.
Nesse sentido, esta pesquisa foi reveladora.
Encontrou as primeiras evidências empíricas da preparação de produtos semelhantes a pão por caçadores-coletores natufianos de 14,4 mil anos atrás, 4.000 anos antes do surgimento do modo de vida agrícola neolítico.

A descoberta de restos de alimentos carbonizados permitiu a reconstrução da receita, e da cadeia operatória, para obter todos os produtos, para a produção inicial de produtos semelhantes a pão.
Os resultados sugerem o uso de ancestrais selvagens de cereais, que posteriormente seriam domesticados (por exemplo, einkorn selvagem) e tubérculos de junco para produzir produtos semelhantes a pão achatado.
Refeições à base de cereais, como o pão, provavelmente se tornaram alimentos básicos quando os agricultores neolíticos começaram a depender do cultivo de espécies de cereais domesticadas para sua subsistência.
Significa que o uso de cereais em receitas alimentares como o pão pode ter dado um impulso para o desenvolvimento da agricultura.
“O significado deste pão é que ele mostra investimento de esforço extra para produzir alimentos que tenham ingredientes misturados. E fazem uma espécie de receita”, diz diz o professor Dorian Fuller, da UCL (University College London)

“Isso implica que o pão desempenhou um papel especial para ocasiões especiais. E isso, por sua vez, sugere uma das possíveis motivações para, mais tarde, as pessoas escolherem cultivar e domesticar o trigo e a cevada, porque eles já eram espécies que tinham um lugar especial em termos de alimentos especiais.”
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Da análise dos pães fósseis aos materiais da receita
Fizeram parte da pesquisa uma equipe de pesquisadores da Universidade de Copenhague, do University College London e da Universidade de Cambridge.
Foram analizados restos de alimentos carbonizados de um sítio arqueológico natufiano de 14.400 anos de caça e coleta — um sítio arqueológico conhecido como Shubayqa 1, localizado no Deserto Negro, no nordeste da Jordânia.

“A presença de centenas de restos de alimentos carbonizados nas lareiras de Shubayqa 1 é uma descoberta excepcional e nos deu a oportunidade de caracterizar práticas alimentares de 14.000 anos. Os 24 restos analisados neste estudo mostram que ancestrais selvagens de cereais domesticados, como cevada, einkorn e aveia, eram moídos, peneirados e amassados antes de serem cozidos. Os restos são muito semelhantes aos pães achatados sem fermento identificados em vários sítios neolíticos e romanos na Europa e na Turquia.
Portanto, agora sabemos que produtos semelhantes ao pão eram produzidos muito antes do desenvolvimento da agricultura. O próximo passo é avaliar se a produção e o consumo de pão influenciaram de alguma forma o surgimento do cultivo e da domesticação de plantas”, disse a arqueobotânica Amaia Arranz Otaegui, da Universidade de Copenhague, primeira autora do estudo.
O arqueólogo Tobias Richter, da Universidade de Copenhague, que liderou as escavações em Shubayqa 1, na Jordânia, explicou:
Os caçadores-coletores natufianos são de particular interesse para nós porque viveram em um período de transição, quando as pessoas se tornaram mais sedentárias e sua dieta começou a mudar.
Lâminas de foice de sílex, bem como ferramentas de pedra moída encontradas em sítios natufianos no Levante, há muito tempo levam os arqueólogos a suspeitar que os humanos haviam começado a explorar as plantas de uma maneira diferente e talvez mais eficaz.

Mas o pão achatado encontrado em Shubayqa 1 é a evidência mais antiga de panificação recuperada até hoje e mostra que a panificação foi inventada antes do cultivo de plantas. Portanto, essa evidência confirma algumas de nossas ideias.
De fato, pode ser que a produção inicial e extremamente demorada de pão à base de cereais selvagens tenha sido uma das principais forças motrizes por trás da revolução agrícola posterior, na qual cereais selvagens foram cultivados para fornecer fontes mais convenientes de alimento. reflete o arqueólogo Tobias Richter
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A receita do pão refeita e assada surpreendeu
Pegue a farinha feita de trigo e cevada selvagens, misture com raízes trituradas de plantas, adicione água e asse.

O preparo começa com farinha de trigo e de cevada selvagem. Em seguida, acrescenta-se as raízes de plantas selvagens que crescem na água.
Aos ingredientes, mistura-se com água para virar uma massa, que depois é assada em pedras quentes ao redor do fogo.
Segundo os cientistas, essa é a receita do pão mais antigo do mundo, com mais de 14 mil anos.
Seu formato para assar seria parecido com o de um pão achatado e o gosto parecido com o do pão multigrãos dos dias atuais.
Nossos antepassados podem ter usado esse pão para enrolar a carne ao assá-la. Assim, ele também pode ter sido o sanduíche mais antigo.
“Esta é a primeira evidência que temos do que poderíamos chamar de cozinha, com um produto misto de alimentos”, diz o professor Dorian Fuller, da UCL (University College London),
“Eles têm pães ázimos (sem fermento) e têm gazela assada e assim por diante, e isso era algo que estavam usando para fazer uma refeição.”
O pão era sem fermento e teria se assemelhado a um envoltório, a uma espécie de pão pita ou chapati (indiano).
Pesquisadores tentaram reconstruir a receita no laboratório.
Eles dizem que os grãos misturados deram ao pão um sabor de nozes, muito parecido com os pães multigrãos de hoje.
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O Povo Natufiano que produziu o pão eram Caçadores e coletores
As pessoas que viviam há 14 mil anos na área da Jordânia onde os restos de pão foram achados eram caçadores.
Eles caçavam gazelas e animais menores, como lebres e aves. E também buscavam alimentos vegetais, como nozes, frutas e cereais silvestres.
Os pesquisadores acham que o pão foi feito quando as pessoas se reuniam para algum tipo de celebração.
Isso aconteceu antes do advento da agricultura, quando as pessoas começaram a cultivar cereais e a criar animais para se alimentar.
Isso levanta a intrigante possibilidade de que o cultivo de cereais para pão possa ter sido a força-motriz por trás da agricultura.
Restos carbonizados fossilizados do pão sob o microscópio
Os restos de comida carbonizados foram analisados com microscopia eletrônica em um laboratório da University College London pela candidata a doutorado Lara Gonzalez Carratero (Instituto de Arqueologia da UCL), especialista em pão pré-histórico:

“Isso seria um pão feito de trigo selvagem e farinha de cevada selvagem, misturado com água e cozido em uma lareira”, diz. “Há também a adição de farinha de tubérculo selvagem, o que lhe confere um gosto levemente amargo e com sabor de nozes ou castanhas.”
“A identificação de ‘pão’ ou outros produtos à base de cereais em arqueologia não é simples. Há uma tendência a simplificar a classificação sem realmente testá-la em relação a um critério de identificação.
Estabelecemos um novo conjunto de critérios para identificar produtos semelhantes a pão achatado, massa e mingau no registro arqueológico. Usando Microscopia Eletrônica de Varredura, identificamos as microestruturas e partículas de cada vestígio de alimento carbonizado”, disse Gonzalez Carratero.
“O pão envolve um processamento intensivo de mão de obra, que inclui descascamento, moagem de cereais, amassamento e cozimento. O fato de ter sido produzido antes dos métodos agrícolas sugere que era visto como especial, e o desejo de produzir mais desse alimento especial provavelmente contribuiu para a decisão de começar a cultivar cereais. Tudo isso depende de novos desenvolvimentos metodológicos que nos permitem identificar os restos de pão a partir de fragmentos carbonizados muito pequenos usando alta ampliação”, disse o Professor Dorian Fuller (Instituto de Arqueologia da UCL).
A pesquisa sobre práticas alimentares pré-históricas continua. Muitas surpresas virão. A aventura da primeira descoberta segue.
A equipe da Universidade de Copenhague garantirá que a pesquisa sobre a produção de alimentos durante a transição para o Neolítico continua.
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É Livre a reprodução de matérias mediante a citação do título do texto com link apontando para este texto. Crédito do site Nature & Space
PÃO ANTECEDEU A AGRICULTURA: HÁ 14 MIL ANOS ERA MULTI GRÃOS
Bibligrafia
University of Copenhagen – Faculty of Humanities
Revista Nature
A trail of breadcrumbs leads to the oldest known bread in the world
Revista PNAS
Archaeobotanical evidence reveals the origins of bread 14,400 years ago in northeastern Jordan