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Atualizado 23 de junho de 2025 por Sergio A. Loiola

Em seu manuscrito intitulado O Método, Arquimedes descreve uma abordagem radical que nenhum matemático havia chegado perto de inventar. Ele tinha consciência da importância do que havia feito, e pediu para por seu método fosse escrito em sua lapide quando morresse.

Até então, era possível encontrar vestígios de Arquimedes, entre as orações

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O Método de Arquimedes

Como já se conhecia o volume de um cone e de um cilindro, ele tentava equilibrar a esfera e o cone de um lado com o cilindro no outro. Tudo isso mentalmente.

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Arquimedes imaginou um número infinito de cortes e, usando uma matemática muito complexa, encontrou uma maneira de equilibrar os objetos nas escalas.

O matemático considerava a descoberta tão importante que pediu que fosse inscrita em sua lápide.

Ao arquitetar volumes usando cortes infinitos, Arquimedes dava o primeiro passo em direção a um ramo vital da matemática, conhecido como cálculo, 1,8 mil anos antes de ser inventado.

O conceito do infinito segue sendo um dos mais complicados da matemática | Foto: Getty Images

O mundo moderno não poderia existir sem o cálculo – é essencial para cientistas e engenheiros, e a tecnologia do século 21 depende disso.

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Quase 2 mil anos depois da morte de Arquimedes o Manuscrito reaparece

Quase 2 mil anos se passaram de anos se passaram até que o manuscrito do grego viesse à tona novamente. Ninguém sabe como, mas ele apareceu em uma biblioteca de Constantinopla, atual cidade turca de Istambul.

Em 1906, ao revisar o catálogo da biblioteca, Johan Ludvig Heiberg, especialista dinamarquês em cultura grega, se deparou com algo no documento que despertou sua curiosidade.

Johan Ludvig Heiberg foi a Constantinopla porque suspeitava que tinha algo de Arquimedes no manuscrito

Como não podia retirar o manuscrito da biblioteca, Heiberg tirou fotos das páginas e, com base nelas, tentou reconstruir o trabalho de Arquimedes, uma tarefa incrivelmente árdua quando sua única aliada era uma lupa.

De qualquer forma, a descoberta de Heiberg revelou ideias que até então não eram conhecidas.

No livro, Arquimedes não só dava as respostas para seus cálculos, como tinha escrito seus pensamentos mais íntimos, revelando como tinha feito seu trabalho.

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Outro desaparecimento

Em 1914, quando estava prestes a descobrir a verdadeira genialidade de Arquimedes, o plano de Heiberg de estudar o manuscrito em Constantinopla foi bruscamente interrompido.

Com o início da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), a Europa e o Oriente Médio foram tomados pelo caos, e o palimpsesto onde estavam os escritos do matemático se perdeu novamente.

Os acadêmicos tinham poucas esperanças de reaver o documento, mas, em 1971, Nigel Wilson, um especialista em Grécia antiga, ouviu falar de uma página de um manuscrito em uma biblioteca da Universidade de Cambridge, no Reino Unido, e foi investigar.

Por que apenas uma página do palimpsesto de Arquimedes foi parar em Cambridge?

Como uma página do manuscrito chegou à biblioteca da Universidade de Cambridge? | Foto: Getty Images

Uma pista era sua procedência: uma coleção de documentos que pertencia a um erudito chamado Constantine Tischendorf, um homem de poucos escrúpulos.

No início do século 20, Heiberg contava só com uma lupa para ler o manuscrito. Nos anos 1970, Nigel Wilson tinha a seu favor a tecnologia moderna.

“A maior parte da página era legível e, com a lâmpada ultravioleta, os cantos, que não podiam ser lidos, ficaram nítidos.”

A tecnologia dos anos 1970 revelou ainda mais detalhes da escrita

Após a 1ª Guerra Mundial, Paris e outras cidades europeias foram inundadas de obras de arte do Oriente Médio, mas ninguém tinha visto o documento de Arquimedes.

Em 1991, Felix de Marez Oyens começou a trabalhar para a casa de leilões Christie’s e, em seu novo escritório, encontrou a carta de uma família francesa que dizia ter um palimpsesto.

Os proprietários contaram que, na década de 1920, um parente que era colecionador amador havia adquirido o manuscrito em Constantinopla. Agora eles queriam vendê-lo.

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Algo inestimável tem Preço?

O manuscrito foi vendido por muito mais. Um bilionário anônimo pagou US$ 2 milhões.

Em 1998, era chegada finalmente a hora de recuperar o conhecimento perdido por mais de dois milênios. Alguns meses após comprar o manuscrito, o novo dono entregou o documento ao Museu de Arte Walters, em Baltimore, no estado de Maryland, nos EUA.

Cientistas, restauradores e historiadores começaram a se debruçar sobre a obra.

Página do manuscrito com textos religiosos (acima); tecnologia revela (abaixo) o que não era possível visualizar antes

Usando tecnologia de imagem multiespectral e uma técnica de raio-X que faz brilhar o ferro da tinta que foi raspada, eles descobriram que o documento continha não só sete tratados de Arquimedes, como também discursos de Hipérides, político e orador ateniense, e comentários sobre as categorias de Aristóteles do século 2 ou 3.

Entre os tratados do matemático grego, estava a única cópia sobrevivente do Stomachion de Arquimedes, no qual ele tenta descobrir de quantas maneiras é possível combinar 14 peças fixas para formar um quadrado perfeito.

Esta é uma das combinações possíveis, mas quantas mais existem? | Foto: Science Photo Library

A resposta é 17.152 combinações.

Stomachion significa dor de estômago, que é como se referiam aos enigmas na antiguidade.

Trata-se do primeiro trabalho a desenvolver a matemática das combinações, que é a base da probabilidade, algo que se acreditava ter surgido nos séculos 17 ou 18.

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Até o infinito

Sem dúvida, a leitura de O Método deixou claro que Arquimedes deu um grande passo para a compreensão do infinito; mais que isso, usou o conceito como parte do argumento de um de seus teoremas.

Arquimedes estava mais próximo da ciência moderna do que se imaginava. Embora se soubesse que ele tinha dado alguns passos na direção do cálculo moderno, o palimpsesto mostrou que, de certa forma, o grego já havia chegado lá.

Nesta imagem, vemos os escritos religiosos em uma direção e a narrativa de Arquimedes na outra

O que teria acontecido, então, se esse documento não tivesse sido perdido?

Se os matemáticos do Renascimento tivessem tido acesso a ele?

Por que o mundo levou 2 mil anos para descobrir o avanço de Arquimedes no estudo da Matemática

Conhecimentos foram resgatados com tecnologia moderna, mas o que aconteceu durante os séculos em que o texto estava perdido?

Tudo começou em Siracusa, na região da Sicília, na Magna Grécia (sul da península Itálica colonizada pelos gregos), no ano de 287 a.C.. Foi quando Arquimedes, um gênio que estava séculos à frente do seu tempo, nasceu.

Arquimedes é popularmente conhecido como o homem que gritou “Eureka!” na banheira.

Poucos lugares são melhores para pensar do que a banheira | Foto: Science Photo Library

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Ele estava tentando resolver um mistério sobre a coroa de ouro do rei.

O monarca suspeitava que o ourives que fabricou a coroa tinha misturado prata, metal mais barato, ao ouro que ele tinha fornecido para confecção do objeto.

A coroa tinha o peso certo (equivalente à quantidade de ouro fornecida pelo rei), mas como a prata é mais leve do que o ouro, a questão era: será que a coroa tinha um volume maior do que se tivesse sido fabricada em ouro maciço?

Certa vez, ao entrar na banheira para tomar banho, Arquimedes percebeu que quanto mais seu corpo ficava submerso, mais água transbordava.

A partir desta observação, ele concluiu que poderia estabelecer quão grande era a coroa do rei ao imergi-la em um recipiente com água e medir a quantidade de líquido que seria deslocado.

Getty Images

Inventor famoso

Não sabemos se os cidadãos da Sicília realmente viram Arquimedes nu, mas a verdade sobre a coroa do rei foi revelada: o ourives tinha sido desonesto e o matemático havia se mostrado um excelente detetive.

Durante sua vida, Arquimedes tornou-se famoso por suas invenções e temido por suas armas de guerra.

Foi também nomeado conselheiro militar pelo rei de Siracusa, que o confiou a defesa da cidade.

A garra de Arquimedes teria sido uma arma projetada por ele para defender a cidade de Siracusa | Foto: Getty Images

Mas é por meio da matemática que sua verdadeira genialidade aparece. Foi ele que considerou estimar um valor para π (Pi), vital para calcular a área de um círculo, um dos componentes básicos da ciência.

Ele fez isso colocando um círculo entre polígonos, já que seu perímetro pode ser calculado, pois seus lados são retos.

Ele começou inserindo um hexágono dentro do círculo e outro fora. Em seguida, foi adicionando mais e mais lados até chegar a 96.

A ideia era fazer com que os polígonos se aproximassem o máximo possível do perímetro do círculo, o que lhe daria os limites cada vez mais próximos entre os quais deveria estar π.

Arquimedes usou polígonos de 96 lados para encontrar um valor aproximado para o número Pi

Ele calculou assim que o valor de π estava entre 310/71 (aproximadamente 3.1408) e 31/7 (cerca de 3.1429), uma estimativa que ainda é usada pelos engenheiros hoje – e é mais do que suficiente para todos os propósitos práticos.

Obcecado por matemática, o estudioso não enxergava nenhum problema como difícil demais.

Ele chegou a tentar, inclusive, calcular a quantidade de grãos de areia necessários para preencher todo o Universo.

A resposta: 10, seguido de 62 zeros.

Os historiadores da época contam que Arquimedes ficava eufórico quando descobria formas matemáticas cada vez mais complexas.

4 triângulos e 4 hexágonos formam um tetraedro truncado …

12 quadrados, 8 hexágonos, 6 octágonos – octaedro truncado …

12 pentágonos, 30 quadrados e 20 triângulos, 60 vértices, 120 arestas, 62 faces: um rombicuboctaedro.

Basta!

Rombicuboctaedro, um dos sólidos descobertos por Arquimedes | Foto: Cortesia Cyp que POV-Ray

Tragicamente, Arquimedes ficou tão conhecido que até os romanos sabiam da sua existência e desejavam capturá-lo.

Quando finalmente conseguiram invadir a cidade de Siracusa, deram ordem para prendê-lo. Mas o soldado que o encontrou se distraiu e, sem notar a confusão ao seu redor, não recebeu as instruções corretas. Por isso, matou-o com a espada.

Ilustração mostra o trágico fim de Arquimedes | Foto: Science Photo Library

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O fim da era de ouro da Matemática grega

A morte de Arquimedes, em 212 a.C., marcou o fim de uma era de ouro na matemática grega, que foi declinando gradualmente.

No entanto, seus manuscritos sobreviveram, sendo reproduzidos por escribas que transmitiram seus conhecimentos de geração para geração. No século 10, foi produzida uma cópia final de suas obras mais importantes.

Mas o interesse pela matemática havia se perdido, e o nome de Arquimedes foi esquecido.

Conhecimento de Arquimedes estava prestes a ter um destino pior que o esquecimento | Foto: Science Photo Library

Certo dia, no século 12, um monge ficou sem pergaminhos. A consequência disso foi desastrosa.

As páginas da cópia final da obra mais importante de Arquimedes foram reutilizadas para fazer um livro de orações.

Cada uma das folhas que formavam uma página dupla do manuscrito foram cortadas e dobradas para dar origem a novas páginas, que, após serem lavadas e raspadas, ficaram suficientemente claras para se escrever novamente sobre elas.

O manuscrito foi reciclado e transformado em um palimpsesto – um papiro ou pergaminho que “mais uma vez” (palin, em grego) foi “raspado” (em grego, psao) para apagar o que estava escrito e ser reutilizado.

Tornou-se, assim, um livro de orações do mosteiro de Mar Saba, no deserto da Judeia, no Oriente Médio.

O renascimento matemático

No século 15, o Renascimento chegou à Europa. A ciência avançou o suficiente para que os estudiosos compreendessem os argumentos matemáticos de Arquimedes.

No entanto, ninguém tinha noção que algumas de suas maiores ideias haviam se perdido.

Os matemáticos renascentistas tiveram que lidar com conceitos e problemas que Arquimedes havia resolvido 1,5 mil anos antes.

Arquimedes voltou a povoar o imaginário coletivo no Renascimento, como mostra essa pintura de Domenico Fetti (1589 – 1623), mas ninguém suspeitava que, sob textos religiosos, havia um tesouro escondido

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A reprodução de matérias é livre mediante a citação do título do texto com link apontando para este texto. Crédito do site Nature & Space 

ARQUIMEDES CRIOU O CÁLCULO INFINITESIMAL? SEU MANUSCRITO “O MÉTODO” INDICA QUE SIM

Fonte

BBC

Por que o mundo levou 2 mil anos para descobrir o avanço de Arquimedes no estudo da Matemática

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